sexta-feira, 26 de março de 2010

Sobre o Ensino Universitário Privado no Brasil

Há muito tempo sinto a necessidade de divagar um pouco a respeito da educação superior em nosso País. Como Professor, venho me deparando com inúmeros problemas enfrentados pelos diversos profissionais envolvidos com esta esfera de conhecimento. Desde a pouca qualificação dos alunos até a forma como é tratado o Corpo Docente, principalmente em Instituições de Ensino Superior Particulares.

Nosso modelo de Ensino Superior é híbrido, ou seja, possuímos um conjunto de Universidades públicas (as melhores e mais qualificadas) junto de um conjunto formado por Universidades, Faculdades e Centros Universitários privados. Não tenho nada a reclamar deste tipo de modelo, mesmo porque entendo perfeitamente que o poder Público não possua verbas necessárias para oferecer educação superior gratuita de qualidade a 100% da nossa população apta a freqüentar tais cursos.

O problema que enfrentamos atualmente é a “baixíssima” qualidade dos cursos universitários oferecidos pela grande maioria das Instituições particulares (claro, existem exceções que analisarei em um próximo artigo sobre o tema).

O que ocorre com o aluno brasileiro (fato conhecido pela imensa maioria de nossa população) é que os melhores cursos universitários, os cursos Públicos, são freqüentados pela parcela mais abastada de nossa população. Os “mais ricos” podem oferecer cursos de ensino fundamental e ensino médio de nível mais alto o que permite que os felizardos, da classe mais rica de nossa população, tenham mais capacidade de enfrentar o gargalo dos vestibulares das Universidades Públicas mais qualificadas.

O que resta ao resto? O "resto" a que me refiro, é o restante da população brasileira, que merece uma educação de base digna mas que não a recebe por incompetência dos orgão responsáveis. À este enorme (e potencialmente fundamental) contigente de estudantes resta as vagas nas diversas opções de Universidades, Faculdades e Centros Universitários (por que será que existem “Centros Universitários”?) particulares, espalhados por todo o nosso imenso País.

Sou um Profissional atuante nesse meio Universitário particular e posso, com conhecimento, enumerar os diversos problemas que enfrento no dia a dia e na experiência com meus alunos (diga-se de passagem, os menos culpados por tais problemas).

O Professor que atua na iniciativa privada não tem as mesmas liberdades (com raras exceções) que o Professor da rede pública (sempre me reportando ao ensino superior). O aluno, na iniciativa privada, é visto como um cliente (novamente alerto o leitor de que esse comportamento não é da totalidade das Faculdades e Universidades Particulares. Existem honrosas e claras exceções.) e é tratado com tal. Ou seja, o Professor da iniciativa privada tem que pensar mil vezes antes de reprovar qualquer aluno em sua disciplina, pois tal reprovação pode ter conseqüências sérias para a carreira do Profissional.

Tome como exemplos disciplinas como Cálculo Diferencial e Integral ou Física. Pela baixíssima qualidade do ensino fundamental e do ensino médio públicos, os alunos, formados em tais cursos, chegam aos cursos de Exatas sem um mínimo conhecimento de Matemática que os possibilite acompanhar as disciplinas mencionadas acima, de forma aceitável. E, obviamente, tais alunos não têm culpa por esta situação.

Um Professor ministrando tais disciplinas com critério e qualidade reprovará mais de 90% em uma grande maioria das Universidades, Faculdades ou Centros Universitários. Mas o professor não pode reprovar! As “coordenações” destes diversos cursos (principalmente de Exatas e Biológicas) já deixam subrepticiamente claro que deve-se manter, a todo o custo, o aluno em sala de aula e não permitir que os alunos desistam dos cursos (lembrem-se que existem exceções importantes à esta regra).

Pela minha experiência sei que o aluno desiste de um determinado curso quando não tem sucesso em algumas disciplinas, se o insucesso for seqüencial. O que, digamos, é uma posição perfeitamente aceitável, dado que o aluno está pagando pelo conhecimento e está percebendo que não irá conseguir chegar ao fim do curso por não possuir o conhecimento necessário para acompanhar o conteúdo ministrado.

E o que acontece ao Professor que, sabendo de sua responsabilidade social, não aprova o aluno que não tem condições de seguir o curso? Sim, isso mesmo que você está pensando. Dependendo do número de reprovações e dependendo da opinião do aluno a respeito do Professor, este pode ser sumariamente demitido de suas funções, mesmo que as tenha executado com a maior competência possível.

A minha conclusão até aqui é que não é possível ao Profissional de Ensino Superior da iniciativa privada exercer a sua profissão com competência, rigor e honestidade, se tal Profissional lecionar em certas Instituições, onde tal procedimento é comum. O Professor da iniciativa privada precisa ter “jogo de cintura” e “dançar conforme” a música tocada pela Instituição onde leciona (não se esqueçam que existem exceções, ou seja, existem Instituições Particulares que permitem que o Professor exerça o seu poder educativo. Eu mesmo atuo em uma destas Instituições).

Qual seria solução para este problema particular? Mencionei acima que o Poder Público não tem condições de oferecer 100% de ensino universitário gratuito de qualidade, mas este Poder Público tem “totais condições” de fiscalizar!

O Poder Público precisa entender que a Educação exerce um papel chave (fundamental) para o desenvolvimento auto-sustentável do nosso País. Não adianta o Lula aparecer na televisão dizendo que tudo está perfeito, que o seu governo é o melhor governo da história do universo, que a Dilma, além de ser eleita Presidente, também irá ganhar o concurso de miss-universo, etc, etc.

O nosso Governo (qualquer que seja ele) precisa entender, de uma vez por todas, que Educação é prioridade básica e é um conceito chave para o nosso desenvolvimento e para o papel que o Brasil irá desempenhar no mundo em um futuro próximo. Por enquanto somos coadjuvantes, nada mais do que isso. Não tem propaganda governamental que consiga encobrir os problemas gravíssimos que assolam a Educação no nosso País.

Voltando ao tema. O Poder Público precisa fiscalizar! O que quer dizer isso? Quer dizer que o Ministério da Educação e Cultura precisa “cair de pau” em cima das Instituições de Ensino Superior que exijam aprovação de alunos não capacitados.

Criou-se o ENADE (Exame Nacional de Desempenho de Estudantes) para testar o desempenho dos estudantes e, por conseqüência, das Instituições de Ensino. No entanto o que observamos agora é que as Universidades (e o resto) particulares se transformaram em “cursinhos de terceiro grau”, ou seja, tais Instituições não estão mais preocupadas em formar o aluno para o mercado de trabalho ou para a pesquisa científica; agora estes alunos estão sendo treinados para fazer a prova do ENADE!

O que observo é outra distorção gravíssima em nosso ensino superior. Não que o ENADE não seja necessário. É! Mas não se pode permitir que existam estes “cursinhos” superiores. É preciso que nosso Ministério da Educação fiscalize as escolas. É preciso o ENADE e mais algum outro mecanismo que corrija esta distorção.

Outro grave problema observado nas Instituições particulares é a própria composição do corpo docente destas. Muitos Profissionais tratam estas “aulas” em Universidades (e o resto) particulares como simples complemento de sua renda principal, que geralmente é a renda da atividade que o Profissional considera mais importante (um emprego em alguma empresa, por exemplo).

Outro dia, conversando com um Profissional de outra área – cara qualificado, competente no que faz – informei que era Professor Universitário ao que me foi respondido com um certo ar de desprezo: - É... eu também tô pensando em pegar umas “aulinhas” pra ganhar um troquinho extra...

Não respondi. Mas pensei muito no assunto. É dessa forma que o resto da sociedade Brasileira vê a nossa Profissão, ou seja, UM BICO. Um simples bico para “tirar um troquinho”. É culpa da sociedade? Claro que é!

A sociedade é que elege os seus governantes. Se os governantes não dão atenção à Educação isso nos informa que esse assunto não é importante também para a nossa sociedade. Afinal, quem colocou estes caras lá em Brasília?

O Ministério da Educação precisa fiscalizar. Precisa exigir que as “Privadas” criem planos de carreira para os Profissionais da Educação superior. Precisa exigir que tais Profissionais sejam qualificados. Que possuam Doutorado. Isso mesmo! Professor Universitário tem que ser Doutor em sua área. Precisa conhecer profundamente sobre o conteúdo de sua disciplina. Mas precisa saber que será bem recompensado pelos seus esforços.

Este é um artigo breve e “coloquial”. Só para mostrar a “ponta do Iceberg” do descalabro que se tornou o Ensino Superior Privado em nosso País. Acredito que o setor privado possa fazer a diferença para a evolução educacional no nosso País. Mas correções precisam ser feitas. A mentalidade dos Proprietários de Universidades precisa mudar. Estes precisam entender o papel fundamental que terão no desenvolvimento do Brasil.

Não será possível que todas as soluções para os nossos problemas educacionais venha do Setor Público. Acredito que o Setor Privado possua todas as condições de assumir esse papel no desenvolvimento de uma educação superior de nível e que possibilite a formação de mão de obra qualificada. Mão de obra essa que colocará o Brasil no primeiro plano do cenário mundial.

2 comentários:

  1. Olá,

    Achei muito interessante seu artigo, pois retrata uma realidade que muitas vezes é dificil de aceitar. Meu nome é Mariane e tenho 21 anos, estudei toda minha vida em escola pública, assim que sai percebi o quanto é díficil, você ter que aprender coisas que não aprendeu direito. Sempre tive facilidade na matéria de exatas na escola, no entanto, saí confiante do ensino médio de que eu poderia entrar em uma faculdade pública, mas percebi que não seria tão fácil, pois havia muita deficiência no que eu aprendi.Comecei a fazer cursinho e percebi que no meu ensino médio e no ensino fundamental eu não fui preparada para responder questões de racícionio lógico e problemas que exigiam mais de mim, como os que caem nas provas da Fuvest e nas Federais, percebi que aprendi o muito fácil, e posso dizer que isto me desanimou muito. Pois via alunos que estudaram sempre escola particular resolvendo problemas complexos de olhos fechados, enquanto eu muitas vezes ficava três dias para resolver tal problema. Então desisti do cursinho, e pensei que não poderia ficar muito tempo estudando para tentar na USP, pois eu preciso ajudar em casa, preciso ter uma remuneração melhor, sabe. Então comecei a faculdade privada mesmo, e totalmente diferente do que eu planejava, pois eu tinha achado que exatas não era pra mim, foi como se o cursinho tivesse tirado minha auto-estima (não sei explicar). Percebi que sentia falta de algo no curso que tinha escolhido de alguma forma e percebi q precisava escolher um curso com exatas. Troquei e comecei fazer Administração ( nada de fazer engenharia de produção, que era o q eu sempre quis fazer, por medo de não dar conta), mas enfim, existe muitas deficiências no professores de faculdade privadas que eu percebi e também na inexperiência dos alunos, pois o professor esta passando coisas simples, como equações, inequações, conjuntos, expressões algébricas, e muitos dos alunos tem muita dificuldade, mas muita mesmo, em resolver as questões. Sinceramente, na minha opinião, acho que deve-se investir no ensino público, e preparar os alunos de verdade, mas não vemos isso. E isso acaba fazendo oom que os alunos saiam do ensino médio, como se não tivessem aprendido, e comecem uma faculdade sem preparação. Sem contar que como você disse, as faculdade privadas também precisam de uma modificação, pois para eles o importante é lucrar, quanto mais alunos, mais dinheiro para eles . Tenho um professor que dá aulas, olhando sempre para o relógio, é como se ele não quisesse dar aula. Sem contar o vestibular, que qualquer pessoa consegue passar, como muitos dizem, é somente deixar o Rg cair dentro de uma faculdade privada, que você já tem sua vaga garantida.

    Mas por mais que esteja difícil, continuo estudando para entrar em uma publica ou federal, e vou prestar esse ano.
    Se eu passar, deixo um comentário de comemoração.rs

    Eu desabafei no comentário, desculpa!!!
    Adorei seu blog e já estou seguindo,

    Beijão.

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  2. Estou estudando a 6 semestres em uma Universidade Particular porque na minha cidade não há uma federal, infelizmente. Depois de muito verificar com os professores e coordenadores da própria universidade, vi que a grade curricular era criada conforme o interesse das empresas locais.
    Faço o curso de Ciências da Computação e ao comparar a grade curricular do meu curso com o de outras universidades que oferecem a mesma formação, me deparei com um cenário pelo menos desanimador. Meu curso não oferece nem a metade da qualificação e das opções de especialização (matérias optativas) existentes em outras instituições. Ouvi certa vez um professor mencionar que as matérias de cálculo foram tiradas da grade porque os aluns trancavam o curso.
    Decidi então trocar de universidade e começar tudo do zero, infelizmente para isso terei que trocar de cidade e de emprego, mas acredito que seja um passo importante para minha carreira.
    Escrevi esse comentario também como desabafo pela decepção com a universidade que estudo, mas também para alertar a todos os jovens que o caminho ainda está nas instituições federais, e que não importa quantos anos demore para passar ou se formar, educação é o meio para saber nos defender e exigir, e para repassar o que aprendemos de bom, e sermos ouvidos por conta da formação que recebemos.

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